FREGUESIA DE GESTAÇÔ
A freguesia de Gestaçô, denominada outrora por S. João do Campo de Gestaçô, tem como orago S. João Baptista, está separada de Mesão frio, distrito de Vila Real, pelo Rio Teixeira e tem uma área de 1.408 há, o que representa 8.01% da área total do concelho de Baião.
Há quem confunda, principalmente através de documentos antigos, o topónimo Gestaçô com Gestaco (leia-se Gestáço), antigo concelho em terras de Amarante e cujo orago é Santa Maria.
Etimologicamente, Gestaçô deriva de «genestazolo», que significa um pequeno «genestal», gestal, giestal, sítio onde há «genestas», gestas, giestas.
Refira-se que cerca do ano 980, certas «vilas» em Gestaçô que pertenciam á poderosa condessa Mumadona Dias, fundadora do castelo de Guimarães e viúva do conde galego Hermenegildo Gonçalves, serviram de troca por outras terras situadas em Ferreira, que foram doadas em 959 ao mosteiro «duplex» de Guimarães (S. Salvador e Santa Maria), do qual também foi a fundadora.
Outrora, os senhores das terras tinham poder para castigar os criminosos, tolhendo-lhes os membros, cegando-os ou tirando-lhes a vida, segundo seu arbítrio, mas uma doação forçada ao senhor da terra, bastava para diluir a culpa. Segundo um documento de Alpendorada, datado do ano 1068, uma viúva de nome Bona, fez uma doação a D. Múnio Viegas e sua mulher, D. Unisco Trastamires, de uma herdade situada em Gestaçô, para que deixasse com vida o seu filho Diogo que tinha cometido um «forçamento» em casa dos donatários, furtando muitas coisas e feito grandes malfeitorias, pelas quais estava preso na cadeia de Benviver (Marco de Canaveses) e a ponto de ser punido com pena capital por sentença do mesmo D. Múnio Viegas, que era filho do 2º Gasco, D. Egas Moniz «o velho».
No ano de 1070, o lugar de Marnotos desta freguesia de Gestaçô «in Genestazolo villa marnotos», foi doado pelo rei D. Garcia de Galiza, ao seu fiel homem Afonso Ramires.
Refira-se que metade da terra de Gestaçô foi propriedade de fidalgos, que a estirpe dos «de Baião» sempre trouxe por honra e segundo as inquirições régias de 1258, através de umas cartas que possuía D. Estevão Ermiges «de Teixeira», a outra metade foi reguenga desde o tempo em que o «imperador» a confiscou e «deitou em reguengo por escusa» ao cavaleiro D. Ero.
É muito pouco provável tratar-se do magnate conde D. Ero Fernandes, governador de Lugo no reinado de Ordonho II, opulento de haveres, possível ascendente de D. Arnaldo de Baião e irmão do conde D. Diogo Fernandes, pai da condessa D. Mumadona Dias.
Tudo indica que, após a independência de Portugal, todos esses bens tivessem passado para a coroa, porque metade de Gestaçô continuou reguenga e o rei D. Afonso Henriques, em 1129, doou a igreja e a outra metade de Gestaçô, a D. Ermígio Viegas, filho de D. Egas Gosendes «de Baião». Este facto é confirmado num documento de Lamego onde consta que no ano de 1166, na cidade de Évora, quando acabaram os mouros «Era MCCIIII civitate Elbora et quando fuit ablata Mauris», D. Afonso Ermiges «de Baião» doou a Nuno Gomes uma herdade situada em Quintela «Vila Quintanela», que foi de eu pai D. Ermígio Viegas «de Baião» e que este tinha recebido de D. Afonso Henriques em 27 de junho de 1129.
De referir que o lugar de Furacasas, também deste freguesia, era um local de cavaleiros chamados «milites de Furacasas» e conforme consta nas inquirições do ano 1258, apoderaram-se de uma vinha e de uns campos foreiros ao rei, em Merelhe e de uma herdade junto ao ribeiro de Vila Nova, que dividia com Baião, todas terras do antigo concelho de Gouveia, no Marco de Canaveses e das quais não pagavam foro algum. Ainda hoje existem os lugares de Merelhe Pequeno e Merelhe Maior, nas faldas Aboboreira, entre Várzea de Ovelha e Aliviada, em Marco de Canaveses.
No século XIII, o Censual do Cabido da Sé do Porto atribuía á igreja de Gestaçô a censoria de uma libra de cera, trintas soldos de mortulhas e quatro bragais ou, na vez destes, trinta e seis soldos.
Em dois documentos datados de 1342, referentes à doação da igreja de S. João de Ovi, contam como testemunhas, Lourenço Domingues clérigo de Gestaçô e Giral Martins, abade da freguesia de Gestaçô.
Datado de 4 de dezembro de 1508, existe na Sociedade de Geografia de Lisboa, um documento (nº 17, maço 1), da coleção Vidigueira, tratando-se de um manuscrito em pergaminho respeitante á «confirmação da apresentação de Manuel Teles, de 14 anos de idade, filho de Rui Teles, para abade e reitor da igreja de S. João de Gestaçô».
No século XVI, o abade era apresentado pelo conde de Unhão, em Felgueiras, tendo de rendimento um conto de reis e os donatários da freguesia eram os ditos condes, que recebiam os quindénios, ou seja, a 15ª parte dos frutos.
A igreja era taxada em cento e cinquenta libras, pagava 557 reis pela visita do bispo, tanto como a de S. Bartolomeu de Campelo, assim como oitenta reis e meio de censo.
Num recenseamento do ano 1530, a freguesia de Gestaçô tinha na totalidade 81 fogos, constando 12 em Logocem, 8 em Marnotos e 61 em locais dispersos.
No século XVII, a igreja de Gestaçô rendia quatrocentos e cinquenta mil reis. Nos documentos do mosteiro de Paço de Sousa, existe uma sentença dada pelo juiz do couto, datada de 14 de junho de 1696, contra Alexandre Pereira e sua mulher, possuidores do Casal de Avezudes, em S. João de Gestaçô, que recusavam assinar o prazo renovado. Foram condenados em assiná-lo dentro de oito dias e ficasse o dito casal devoluto do mosteiro. De referir que, atualmente, o lugar de Avezudes pertence á freguesia de Viariz.
No passal da Igreja de Gestaçô encontra-se uma pedra pertencente ao templo que tem esculpida a data de 1734.
Em pleno século XVIII, mais precisamente no ano de 1747, a igreja de Gestaçô foi retificada em virtude de ter sofrido um incêndio. Na madrugada do dia 15 de agosto de 1958, deu-se um incêndio que reduziu a cinzas a residência paroquial, assim como um prédio anexo.
Conforme revela em 19 de abril de 1758, o então abade Manuel Gomes Ferraz, a freguesia tinha 258 fogos e 933 habitantes, dos quais 90 eram menores, sendo constituída pelos seguintes lugares: Avezudes, Furacasas, Quintela, Urgares, Logocem, Marnotos, Gestaçô, Anquião e Castelo.
A igreja, no seu interior, tinha então cinco altares, embora dois deles por benzer e por acabar: o principal da capela-mor era o do Sacramento e do padroeiro S. João e dos dois colaterais, um era da Senhora do Rosário e outro da Santa Cruz, havendo apenas uma irmandade com o título de Santa Cruz.
O abade de Gestaçô era apresentado pelo conde de Unhão e a igreja tinha anexa a de Loivos do Monte, rendendo ambas ao pároco cerca de um conto de rei. Ainda segundo o abade Manuel Gomes Ferraz, «A renda tem incertezas grandes por causa dos gelos tolherem alguns anos os frutos».
De toda a renda e pé de altar, um capelão do padroeiro recebia a quinta parte. Das restantes quatro partes o pároco pagava um cavaleirato de 200 mil reis (benefício ou renda que recebiam os cavaleiros), tinha a fábrica da capela-mor da igreja de Gestaçô e da anexa de Loivos do Monte, pagava aos curas coadjutores e a um capelão que dizia missa na capela de S. Miguel, no lugar de Anquião, além da censoria á Mitra e ao Mestre Escola da Sé do Porto.
Na freguesia existiam as seguintes capelas: Senhora da Expectação no lugar de Avezudes; Senhora do Bom Despacho em Furacasas; Senhora da Conceição em Quintela; Santo António em Marnotos; outra de Santo António em Anquião, (todas particulares), bem como a de S. Miguel no mesmo lugar de Anquião (sendo fábrica dos moradores do lugar) e que tinha sacramento por viático; S. João no lugar do Castelo (fábrica dos moradores); Senhora da Graça em Gestaçô (fábrica dos fregueses).
Naquela época a freguesia produzia milho grosso, feijão, trigo, centeio e castanha. Nos sítios altos vinho verde e no lugar de Anquião vinho maduro, assim como algum azeite. Na descida do monte denominado Chã de Arcas, de anos em anos semeava-se algum centeio. Havia gado, sobretudo vacas de trabalho, algumas ovelhas, pouca caça de perdizes e algumas lebres. No inverno a freguesia era muito fria e cobria-se de neve.
O rio Teixeira que divide a freguesia de Gestaçô com Mesão Frio, tinha algumas trutas e pouca quantidade de escalos, porque no verão faziam-se as troviscadas que matavam muitos peixes. A troviscada era um método de pescar, utilizando ramos de trovisco que eram mergulhados na água e ao puxarem-nos os peixes vinham agarrados.
Somente no percurso que o rio Teixeira efetua na freguesia de Gestaçô, existiam nove moinhos de cereais e um de azeite. Existiam também duas pontes sobre o rio, uma de cantaria e outra de madeira, ambas no lugar de Anquião, dando passagem para Mesão Frio.
O correio era servido através de Mesão Frio, que distava uma légua e cuja correspondência era recebida às segundas-feiras e despachada ás quintas-feiras, assim como do correio de Arrifana de Sousa (Penafiel), através de um estafeta de Campelo que entregava a correspondência também ás segundas-feiras e levava ás quintas-feiras, donde distava légua e meia.
Realizava-se uma feira ao dia 5 de cada mês e uma feira anual durante três dias seguidos, sendo na véspera do Dia de Santo André, no próprio Dia de Santo André que era feira franca e no dia seguinte ao do referido santo. Atualmente a feira é quinzenal, aos dias 5 e 19, sendo denominada por Feira da Graça.
Na frontaria da igreja, encontra-se metida num nicho a imagem em pedra do orago da freguesia S. João Baptista, colocada sobre uma base em pedra com caracteres romanos indicando o ano de 1764.
No ano de 1855 a côngrua era de duzentos e cinquenta mil reis, conforme consta no mapa geral estatístico das côngruas arbitradas aos párocos e seus coadjutores.
A capela de Nossa Senhora da Graça cuja festa anual é no dia 15 de agosto, tem a parte da capela-mor com abóbada manuelina, situada em terreno que pertence á freguesia de Tresouras, pois passa aí a linha limite das duas freguesias, ficando o restante corpo do edifício em Gestaçô. Na parede interior, a capela-mor tem gravado na própria pedra o ano de 1553 e no púlpito o ano de 1645.
Diz uma lenda que esta Senhora da Graça, juntamente com a Senhora do Alívio também em Gestaçô, Senhora do Marão em Teixeira, Senhora dos Remédios em Lamego, Senhora dos Calvos em Tresouras, Santa Marinha do Zêzere e Santa Eufémia em Fonseca, «eram todas irmãs e filhas de um rei» e que estas sete irmãs «vêem-se umas às outras» do ponto onde se encontram os respetivos templos.
A capela da Senhora do Alívio que também se situa nesta freguesia e perto da igreja de S. Miguel, é muito concorrida pelo povo no primeiro domingo de agosto, onde se realizam grandes festejos.
Com certeza que é a esta festa que se refere o médico / escritor João de Araújo Correia, num texto intitulado «Dia de festa em Baião», inserido na «Revista do Norte» e no seu livro «cartas da Montanha».
Num sítio chamado Candorcas, relativamente perto do lugar de Águas Mortas, foram desenterrados no ano de 1883, junto de um penedo com um sinal gravado, dois grandes vasos vermelhos sem abertura, contendo uma quantidade enorme de moedas romanas em bronze, chamado «Tesouro de Gestaçô».
Após o ano de 1834, o concelho de Baião estava infestado de salteadores, onde também atuava a quadrilha do famoso Zé do Telhado que, pelo que se sabe, assaltou em Anquião, a Casa da Portela, propriedade do Capitão Manuel Monteiro Pinto que perseguiu e ajudou a correr com os militares franceses até aos Pirenéus, aquando das invasões francesas.
Segundo descreve Pinho Leal no «Portugal Antigo e Moderno», o Dr. Valentim de Faria Mascarenhas e Lemos, que era por essa altura administrador do concelho de Baião, juntamente com seu pai Alexandre Faria Mascarenhas e Lemos, conhecido como Alexandrinho de Quintela, ambos de Quintela, desta freguesia de Gestaçô, varreram da estrada do Porto (então estrada real nº 33, hoje estrada nacional 101), muitos salteadores, fuzilando alguns deles, o último dos quais era um homem agigantado e fidalgo distinto, filho do último capitão-mor de Moura Morta.
Este Dr. Valentim era amigo do grande escritor Camilo Castelo Branco e confidenciou-lhe que era neto do regicida José Policarpo «o estalajadeiro dos padrões de Teixeira», procurado pelo Marquês de Pombal, conforme se pode ler no livro de Camilo» O Perfil do Marquês de Pombal», diz-nos que o Dr. Valentim era filho e não neto de Alexandre de Faria e que tinha um irmão de nome Alexandrinho de Quintela, o qual era assim chamado para se distinguir do pai, pois tinham o mesmo nome. Diz ainda que Alexandre de faria, dono da Estalagem de Teixeira e pai do Dr. Valentim, homiziou-se na serrania da Teixeira, por motivos até hoje misteriosos. Contudo, e para esclarecer este caso, António Cabral, no seu livro «Camilo Desconhecido», comprova-nos que de facto José Policarpo homiziou-se em Quintela com o nome de Alexandre Ferreira de Faria Manuel e que era avô do Dr. Valentim de Faria Mascarenhas, sendo fundador da Estalagem dos Padrões da Teixeira.
No lugar de Anquião, desta freguesia de Gestaçô, morou no século XIX, na chamada Casa dos Instrumentos, um homem de nome Guilherme de Almeida da Silva Pinto Sarmento, que fazia e consertava instrumentos de corda, sobretudo violinos e também cavaquinhos, tanto para o nosso país como para o estrangeiro, existindo um registo que, em 1894, reparou um violino. Faleceu nesta freguesia, mas nasceu na Casa do Ervedal, em Santa Marinha do Zêzere.
Na freguesia de Gestaçô existem algumas oficinas onde são fabricadas muitas bengalas principalmente de pau de cerdeira (cerejeira) ou lódão e que se veem por todo o país, assim como cabos de guarda-sol.
Segundo consta no livro «Ecos do País), do médico/jornalista/escritor João de Araújo Correia, a primeira oficina foi montada em 1902 por Alexandre Pinto, no lugar da Mó.
De salientar que no centro da freguesia, no lugar de Carvalhais, existe a «Casa das Bengalas» inaugurada no dia 14 de agosto de 2007, tratando-se do «Núcleo de Artes e Ofícios Tradicionais – Bengalas de Gestaçô», onde estão expostos alguns dos primeiros utensílios do fabrico das bengalas, documentos e fotografias.
Num muro da parte sul junto á igreja matriz e que divide o adro desta com casas particulares, encontra-se embutida uma pedra com uma espada esculpida que tudo indica ser a tampa de um sarcófago da época medieval, tendo precisamente ao lado uma outra pedra lisa com as mesmas dimensões e que poderá ser a base do sarcófago. Também do lado norte do templo, a parte exterior da parede da sacristia contém embutida uma estrela funerária discoide.
No dia 14 de abril de 1909, no lugar de Vilar, desta freguesia de Gestaçô, nasceu o escritor Joaquim Soeiro Pereira Gomes, um dos iniciadores do neorrealismo em Portugal com o seu livro «Esteiros», cuja primeira edição é ilustrada com desenhos de Álvaro Cunhal e dedicada «aos filhos dos homens que nunca foram meninos», tendo falecido no dia 5 de dezembro de 1949.
Um dos personagens do citado livro, o «Gineto», foi mais tarde um grande nadador de nome Batista Pereira, ao qual o escritor baionense ensinou as primeiras letras, conforme consta no livro «As Palavras dos Outros», da autoria de Batista Bastos.
O espólio literário de Soeiro Pereira Gomes, poderá ser apreciado no Museu do Neorrealismo em Vila Franca de Xira.
No centro da freguesia de Gestaçô, no lugar de Carvalhais, encontra-se um monumento erigido em homenagem ao escritor baionense, assim como um outro dedicado ao Emigrante, perto do edifício da Junta de Freguesia e inaugurado em 15 de agosto de 1998.
Nesta freguesia existe a Associação Desportiva, Cultural e Recreativa de Gestaçô, fundada em 1981, que possui um campo de futebol, bem como o Rancho Folclórico da Associação Desportiva, Cultural e Recreativa de Gestaçô, que após alguns anos de inatividade reapareceu em 13 de Julho de 1997, na romaria da Senhora do Marão, a Casa do Povo de Gestaçô – Associação Desportiva fundada em 6 de Junho de 1976 e a ADPAGE – Associação Desportiva para o Desenvolvimento do Património de Gestaçô, constituída em 1977 e que incorpora o Grupo de Bombos de Gestaçô.
Da responsabilidade da Câmara Municipal, foram construídos os sanitários no adro da Igreja Paroquial, inaugurados no dia 24 de junho de 2006, obra imprescindível para a população para apoio á Igreja e á capela mortuária.
A freguesia de Gestaçô é composta pelos seguintes lugares: Águas Mortas, Alcarias, Amieiro, Anquião, Azibreiro, Baiões, Bairro Novo, Boavista, Cabo de Vila, Campo, Candeiro, Carrapatelo, Carvalhais, Casal, Casal da Eira, Cimo de Vila, Eiras, Estrada, Estremadouro, Ferreiros, Fojo, Foz, Fraga, Fundo de Vila, Furacasas, Gavião, Gairão, Giestal, Graça, Igreja, Levada, Logocem, Marnotos, Martiga, Mó, Outeirinhos, Outeiro, Paço, Palhais, Pedrinhas, Peso, Portela, Pulbelho, Quartas, Quintã, Quintela, Ribeira, Santo, Seara, Serdeira, Tapado, Urgares, Vale, Venda e Vilar.
Desta freguesia é árabe o nome do lugar Alcarias (Al-Qaria), significando aldeia e godos os lugares de Sande e Gavião.